Carne de grife’ requer dieta especial para o boi; saiba as apostas dos pecuaristas

José Valdir Brescansin produz grãos e investe no cruzamento da raça senepol com nelore — Foto: Theo Marques

No Paraná, mercado de cortes mais nobres ganha força, principalmente depois do reconhecimento do Estado como livre de febre aftosa

No Paraná, os 45 milhões de toneladas de grãos – milho, soja e outras culturas – que os agricultores produzem seguem rotas distintas: abastecem os compradores do exterior e o mercado doméstico, principalmente as granjas de aves e suínos, mas, nos últimos anos, uma parte cada vez maior tem ficado nos cochos das fazendas, para alimentar um rebanho de corte que é muito bem tratado.

Entre araucárias ao longo do percurso, a reportagem da Globo Rural viajou por 1.300 quilômetros durante a passagem do Caminhos da Safra pelo Estado, em meados deste ano, e visitou algumas fazendas que têm explorado um nicho de alta rentabilidade: o mercado de carnes gourmet.

Considerada entre os criadores uma categoria superior, a chamada “pecuária nobre” ganhou destaque nos últimos anos, em virtude do crescimento da demanda por carnes de alta qualidade, sabor e procedência, características que têm relação não apenas com as raças dos animais, mas também com os sistemas de produção, o marmoreio (gordura visível que se acumula dentro do músculo e entre os feixes de fibras musculares do gado e que dá à carne sabor e maciez) e a alimentação.

No caso do Paraná, um impulso adicional ocorreu em 2021, quando o Estado conquistou o reconhecimento de área livre de febre aftosa sem vacinação, um status com enorme potencial de abrir mercados no exterior à carne paranaense.

Uma das propriedades que apostam na carne gourmet é a de José Valdir Brescansin. Localizada em Maringá, no norte do Estado, a fazenda de 173 hectares se dedica à pecuária de corte e ao cultivo de grãos, como soja, milho e aveia, além de ter também uma granja de frangos. A movimentada BR-376, mais conhecida como Rodovia do Café, dá acesso à estrada vicinal que leva até a Agroindustrial São Geraldo, nome que homenageia o pai de José Valdir, já falecido.

Brescansin, engenheiro químico apaixonado por pecuária, largou o emprego na Petrobras, após 30 anos, para se dedicar à atividade que já vinha desenvolvendo desde 1991, nos períodos de folga da plataforma.

O engenheiro agrônomo é de Maringá e sua propriedade fica a cerca de 20km do centro da cidade paranaense — Foto: Theo Marques

base do rebanho da fazenda é de, em média, 170 a 200 vacas nelore, que são cobertas por touros da raça senepol.

Brescansin deixa de cinco a seis touros juntos com a vacada na época da estação de monta e a bezerrada nas- ce meio-sangue, fruto do cruzamento do senepol com o nelore.

“Tenho também algumas vacas da raça aber- deen-angus. Minhas vacas mais velhas devem ter seis a sete anos, mas, na média, a vacada é novilha e, se for vaca de terceira cria, substituo por vacas mais novas.”

O Paraná produziu na temporada passada 45,5 milhões de toneladas de grãos, sendo 17,6 milhões de toneladas de milho — Foto: Theo Marques

Ele conta que sempre investiu no bem-estar animal, principalmente na nutrição. O esforço é para atender o exigente mercado gourmet, um negócio em que é necessário adotar práticas como pastoreio rotativo, oferta de alimentação de qualidade e de espaço. Foi para cumprir as exigências do segmento que Brescansin decidiu criar o rebanho livre em pequenos piquetes na propriedade.

A boiada é monitorada todos os dias para que se possa avaliar peso, nível de gordura e checar se a alimentação está adequada. A ração tem um mix característico do Sul do país, elaborado com aveia, que garante fibra ao cardápio “fit” dos animais.

Segundo o pecuarista, a receita é certeira para uma engorda estratégica. Assim, os cereais não são só uma opção mais barata: eles servem de suplemento que ajuda na engorda.

Dentro da porteira, o cardápio mais proteico confere maciez e um bom teor de marmoreio, um diferencial de sabor nos pratos dos consumidores. Para manter o bem-estar do rebanho, ele optou por separar o gado em lotes, nos quais é possível colocar 40 vacas no máximo.

A céu aberto, uma espécie de barril virou o cocho adaptado, abastecido com a mistura nutritiva, que os animais podem comer a hora que quiserem, até engordarem o suficiente para se tornarem “carne de grife”.

“Comecei uma parceria com a Maria Macia, uma cooperativa sediada em Campo Mourão (PR), que tem uma butique de carnes e paga um pouco melhor do que os frigoríficos de grande escala. A equipe de lá é altamente exigente com o gado: é preciso ter dois dentes (18 a 24 meses) e núcleos de cobertura de gordura na área do lombo, por exemplo”, contou Brescansin.

O acabamento da carcaça é crucial. É muito detalhe. A gente tem que se esmerar nesse trabalho de preparo dos animais

— José Valdir, produtor rural de Maringá

Ao detalhar as condições físicas do rebanho que garantem um preço, em média, 20% maior do que o da carne bovina convencional, Brescansin desculpa-se por ter de esmiuçar o monitoramento da gordura no traseiro da novilha.

Além disso, ele cita o acabamento da carcaça como crucial para diferenciar a carne. “É muito detalhe, e a gente tem que se esmerar nesse trabalho de preparo dos animais”, disse.

Um gado “super precoce”, aquele com até dois dentes (18 a 24 meses), tem valor mais alto, reforça Brescansin. Para ele, a exigência também está no mercado convencional de carnes, porque o Brasil é o maior exportador do produto no mundo.

A carne “premium” vai para açougues de luxo de cidades médias e capitais brasileiras, nos quais a experiência da seleção, do corte e da forma de servir coroa a produção de pecuaristas que “assinam” a criação. Um quilo de carne de grife pode custar entre R$ 100 e R$ 1 mil.

Com manejo convencional, mas de olho nos detalhes, é que Brescansin cria os animais das raças nelore e senepol. Essa genética se destaca em quase todos os quesitos necessários e exigidos por grifes e marcas no Brasil, além de se adaptar a qualquer projeto de pecuária de corte do Brasil, devido a seus atributos zootécnicos, conforme assegura a Associação Brasileira dos Criadores de Bovinos Senepol (ABCBSenepol).

A entidade oferece aos criadores brasileiros da raça um programa de certificação e bonificação que está integrado à Plataforma de Qualidade – Carne Bonificada da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA).

No médio prazo, Brescansin mira os taurinos e conta com a ajuda dos dois filhos e da esposa para driblar as oscilações de preços. “O mercado hoje é totalmente diferente de 20 anos atrás.

Antigamente, eu poderia vender bois direto no frigorífico, mas hoje não vendo mais. Qualquer estabelecimento exige que você tenha cobertura de gordura e peso, ainda mais para vender para as grifes de carne, que pagam até 20% a mais”, explicou.

Brescansin cria o gado livre, em lotes rotacionados em pequenos piquetes na propriedade — Foto: Theo Marques
Brescansin cria o gado livre, em lotes rotacionados em pequenos piquetes na propriedade — Foto: Theo Marques

FONTE: https://globorural.globo.com/especiais/caminhos-da-safra/noticia/2023/09/carne-de-grife-requer-dieta-especial-para-o-boi-saiba-as-apostas-dos-pecuaristas.ghtml

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